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Toscano / Faleceu ontem o arquiteto João Walter Toscano. Recentemente, ao mergulhar sob a Estação da Luz, de volta da Mooca, falei tanto dele. Aquela arquitetura que é puro fluxo me move como poucas.


Voltei querendo lhe telefonar, e marcar a visita tantas vezes adiada ao Pátio da Vila Sonia, recém-inaugurado, e quem sabe ainda à sua casa na Praia dos Arquitetos. Agora não sei o que dizer. Mas as ruas de São Paulo não serão mais as mesmas. Nem os trens, nem as estações, nem eu.


Releio com dificuldade o texto que escrevi para o seu último livro (João Walter Toscano, J.J.Carol, 2007):




"FIRMEZA E FLUIDEZ
Se fosse possível resumir a obra de João Walter Toscano num único projeto, seria inevitável pensar no terminal da Estação da Luz. Em certo sentido, esse parece ser o ponto culminante de um longo processo iniciado duas décadas antes, no Largo 13, com a premiada estação à qual se seguiu a linhagem de projetos urbanos que hoje constitui um dos veios mais fortes da obra de Toscano.

À diferença, no entanto, de seus antecedentes – como a própria Estação Largo 13, o Terminal Princesa Isabel ou a Estação Pêssego – o projeto para a Estação da Luz não tem presença na paisagem de São Paulo. A não ser pela sinalização visual, não se tem notícia do projeto até que se mergulhe sob a gare centenária. Só então a arquitetura de Toscano se apresenta: uma via de comércio banhada por luz zenital, bilheterias, salas de operação, escadas rolantes, plataformas de embarque e desembarque. Uma rede de espaços por onde circula, dia e noite, o fluxo espantoso de passageiros que constitui nada menos que a própria atividade estruturadora do projeto.

O desafio está justamente em confrontar-se com esse transitar coletivo e intermitente que a bem dizer resume o cotidiano metropolitano. E isso implica, claro, uma espécie de raciocínio essencialmente refratário a qualquer ordem estável, além de uma problematização da própria categoria tradicional de espaço. Nesse sentido, a experiência que essa arquitetura produz – projeto por princípio sem exterioridade nem forma – parece encontrar pontos de contato com a definição de “arquitetura líquida” de Ignasi Solá-Morales: “uma arquitetura que substitui a firmeza pela fluidez e a primazia do espaço pela primazia do tempo”
. Mas essa definição só caberia, para Toscano, até certo ponto. Longe de se bater contra o atributo vitruviano, o arquiteto sustenta a tensão entre firmeza e fluidez, e não se apressa em resolvê-la. "

Que o Rio guarde pelo menos um dos últimos projetos de Toscano, apresentado no concurso para a biblioteca da PUC.

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