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Talk to me / Pedro Cruz é um jovem português, com uma formação ampla que inclui estudos em Física e Informática e um estágio de um ano em Belo Horizonte.

Um de seus trabalhos recentes está na exposição “Talk to me”, inaugurada esta semana no MoMA, em NY: um mapa digital de Lisboa que explora a metáfora da circulação sanguínea na análise do tráfico da cidade. Dá pra sentir o coração de Lisboa batendo:

http://pmcruz.com/information-visualization/lisbons-blood-vessels

Vale a pena também ver toda a seção da exposição dedicada especificamente às cidades:
http://wp.moma.org/talk_to_me/whos-talking/city/



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Cadê o trem? / Três exposições em cartaz não podem deixar de ser vistas: José Resende (MAM), Saul Steinberg (IMS) e Arthur Bispo do Rosário (Caixa Cultural).

A de José Resende tem provocado discussão por conta das peças publicitárias espalhadas pela cidade, que mostram duas obras que na verdade não estão na exposição: o "Passante", instalado há anos no Largo da Carioca, e os vagões suspensos, trabalho efêmero realizado em São Paulo no último ArteCidade. "Mas cadê o trem?", perguntou uma senhora ao visitar a exposição. Parece que ela estava enfurecida, e chegou a exigir o dinheiro de volta. Mas o melhor foi a resposta dada pelo artista, quando soube do ocorrido: "o trem está aí, só que desmontado."

Por sinal, até o final da exposição o Rio verá mais um trabalho de José Resende, só que instalado externamente, do outro lado da passarela que leva ao MAM (e também é projeto de Affonso Eduardo Reidy). A única informação, por enquanto, é que se trata de um trabalho que faz uso de uma luminária pública e de energia eólica, do qual serão instaladas quatro unidades no centro do Rio.


(A foto é de Barbara Cutlak, uma das editoras da Noz. Aliás, cadê a Noz?)


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as Olimpíadas, as Vargens e Lucio Costa /
O Ministério Público entrou com uma ação pedindo a suspensão da nova legislação urbanística que abrange uma extensa área na zona oeste da cidade, incluída no Plano Piloto de Lucio Costa (ao lado). O chamado PEU (Projeto de Estruturação Urbana) das Vargens compreende Vargem Grande, Vargem Pequena, Camorim, parte da Barra da Tijuca, Recreio dos Bandeirantes e Jacarepaguá - ou seja, uma área dotada de um riquíssimo ecossistema, já agredido pela urbanização acelerada e desordenada das últimas décadas, onde agora estão previstas várias instalações olímpicas.


O questionamento das normas em questão foi iniciado há mais de um ano, como se pode ver aqui:
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/10.112/1825
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/10.116/3385



Vale a pena também ler (e reler) o Plano Piloto de Lucio Costa:
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/10.116/3375

O texto (que é de 1969) começa com uma frase que soa ainda mais grave hoje: "O problema do aproveitamento da enorme área que se estende dos Campos e do Pontal de Sernambetiba até a Barra da Tijuca, abrangendo em profundidade a vasta baixada de Jacarepaguá, não é de fácil equacionamento."

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Cidade? / Não canso de recomendar aos meus alunos que leiam Koolhaas. Para mim, é o pensamento mais vivo sobre a cidade contemporânea, e por isso mesmo fundamental neste momento em que o Rio se vê diante de tantas transformações.


Três de seus textos de referência sobre o assunto - Junkspace, Generic City e Bigness - foram publicados recentemente em português (de Portugal) no livro "Três textos sobre cidade", da editora Gustavo Gili.


E agora surgiu uma entrevista na Internet em que, talvez pela primeira vez, Koolhaas fala do Rio. A entrevista começa assim: "As características mais importantes que usamos para definir cidades - que nós definimos tipicamente em termos de espaços públicos, coerência de ruas, praças, composição geral - essas terminologias estão se tornando cada vez menos relevantes para a compreensão do que é a cidade. Se você olha para Dubai ou Beijing ou qualquer coisa no Pearl River Delta, por exemplo, o que vê é que há uma liberdade muito grande aplicada à noção de cidade. A profissão da arquitetura está equipada para lidar com um tipo de cidade - a cidade que tem forma - e permanece, quase por inteiro, inadequadamente equipada para pensar num outro tipo de cidade."


E não falta um alerta dirigido especificamente ao Rio: "se você olhar para o Rio agora, vê que algumas favelas estão sendo consideradas dignas do status de Patrimônio Mundial. Então existe obviamente uma grande consciência quanto ao valor das coisas existentes. Mas isso tem um efeito paradoxal: as coisas existentes são muito acriticamente mantidas porque nem todas realmente merecem vida eterna."


A entrevista está aqui: http://www.pwc.com/us/en/cities-of-opportunity (tem uma versão reduzida em vídeo, mas entrando na seção Interviews é possível também baixar a versão integral , transcrita, em PDF).





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Irmãos Roberto / Mais um documentário sobre arquitetura está sendo produzido: a produtora Titânio realiza um filme sobre os irmãos Roberto, dirigido por Tiago Arakilian.


Uma das obras em destaque é o edifício Julio de Barros Barreto, em Botafogo (Rua Fernando Ferrari, 61, ao lado da Universidade Santa Úrsula). O projeto é de final dos anos 40 e se organiza em dois blocos laminares com apartamentos duplex que se dispõem em ângulo e partilham a mesma torre de circulação vertical, aos fundos, que funciona como uma espécie de dobradiça. Como em outras obras dos Roberto, aqui também a fachada palpitante é a característica mais forte do projeto.
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Porto Olímpico / O resultado do concurso do Porto Olímpico, divulgado recentemente, desencadeou uma grande polêmica. Por um lado, questiona-se o suposto favorecimento da equipe vencedora, pelo fato de seu coordenador ser membro do Conselho Deliberativo do IAB, sócio de um membro do Conselho Superior da mesma instituição, coordenador do concurso do Parque Olímpico, também promovido pelo IAB-RJ, e filho do proprietário de uma construtora envolvida em obras públicas na área portuária. Por outro lado, o IAB se defende argumentando que o edital do concurso jamais impediu a participação de membros de seus Conselhos Deliberativo ou Consultivo, e alega que o processo de seleção seguiu as normas de anonimato determinadas e apresentadas pelo IAB, e tampouco questionadas anteriormente pelos concorrentes. Além disso, afirma que a área de desenvolvimento do Parque Olímpico é outra, e que as obras relacionadas ao concurso não estão abrangidas nas intervenções a serem implementadas pelo consórcio integrado pela construtora mencionada.


A discussão é boa, na medida em que levanta questões não só legais, mas também éticas, e abre um debate sem precedentes sobre a prática profissional da arquitetura no Brasil, num momento delicado, de grande aceleração de oportunidades e globalização de investimentos.


Os dois recursos apresentados por concorrentes do concurso, e já respondidos pela Comissão julgadora, estão aqui: http://www.iabrj.org.br/concurso-porto-olimpico-recursos-e-julgamento-dos-recursos. E todos os projetos concorrentes seguem expostos na sede do IAB, na Rua do Pinheiro, 10.

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Mindlin / A discussão sobre o Pavilhão do Brasil em Veneza, provocada pela infeliz declaração do cineasta Neville d'Almeida, desdobrou-se numa matéria publicada hoje na Folha de S.Paulo.

Aproveito para esclarecer, mais uma vez, que o Pavilhão é assinado por Mindlin em conjunto com Giancarlo Palanti, Walmyr Amaral e Amerigo Nino Marchesin - sendo a equipe composta, portanto, por dois arquitetos italianos (Palanti, como sócio de Mindlin na época, e Marchesin como indicado pela direção da Bienal de Veneza para coordenar os trabalhos na Itália).

Há mais sobre o Pavilhão - inclusive a proposta descartada de um edifício-ponte, muito semelhante ao projeto de Sergio Bernardes para o Pavilhão da CSN no Parque do Ibirapuera - na dissertação de Aline Coelho Sanches ("A obra e a trajetória do arquiteto Giancarlo Palanti. Itália e Brasil", USP-S.Carlos, 2004), que pode ser acessada aqui: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/18/18131/tde-24062008-100259/pt-br.php


Já sobre a reforma do edifício do Jornal do Brasil, veja-se o artigo de Roberto Segre: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/drops/09.026/1787

Posto 07 / jul 11

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Ministério / Passei uns dias desplugada, e na volta, encontro uma série de emails alarmantes sobre as obras de recuperação do edifício-sede do Ministério da Educação, atual Palácio Gustavo Capanema. Nem tive tempo de me informar corretamente ainda, mas transcrevo a seguir um dos documentos que me chegaram, assinado por Maria Elisa Costa (arquiteta, filha de Lucio Costa e presidente em exercício da Casa de Lucio Costa).


"EM DEFESA DO PALÁCIO CAPANEMA


O assunto é importante e urgente: por um lado, cogita-se de propor à UNESCO a inclusão do antigo Ministério da Educação e Saúde na lista dos Bens Culturais da Humanidade; e por outro, existe o propósito de instalar no edifício um Centro de formação de técnicos para o IPHAN (inclusive denominado Centro Lucio Costa) cuja criação contará com suporte da UNESCO através de Projeto de Cooperação Técnica Internacional.


Diante de um programa tão ambicioso, percebe-se uma tendência a pensar na adaptação dos novos usos ao edifício com grande desenvoltura, como se o Capanema fosse um prédio normal – corre-se o risco de que os responsáveis (IPHAN e UNESCO) se esqueçam do mais importante: a preservação da integridade arquitetônica do edifício, que ocupa um lugar excepcional no movimento moderno, não apenas no Brasil, mas internacionalmente.


A inclusão do antigo “Ministério” na lista do Patrimônio Mundial se justifica, inclusive, por duas características de particular significação:

1 – O exemplar cuidado com o meio ambiente, não apenas pela proteção da fachada norte com quebra-sol, mas no sentido de tirar proveito das condições naturais propiciadas pela localização do edifício em frente à barra da baia de Guanabara, ou seja, dispondo de ventilação natural constante – preocupação pioneira, já que, em 1936 (data do projeto) tal abordagem não era prioritária, como hoje é.


Assim, a instalação de ar condicionado central no prédio, além de um contra-senso, seria trair o caráter ecológico pioneiro que lhe é inerente.


Passo a palavra a Lucio Costa, transcrevendo trecho de carta por ele enviada em 1986 ao então Ministro da Cultura Celso Furtado:
“A ventilação natural foi devidamente estudada, antecipando-se, pois, ao atual movimento internacional no sentido da retomada do conceito de “arquitetura bioclimática”, em boa hora assumido por Joaquim Francisco de Carvalho: de fato, graças à caixilharia movediça em todos os vãos do prédio, quando a viração for leve pode-se deixar o caixilho menor descer externamente no peitoril; quando ventar, basta deixar apenas uma nesga aberta de cerca de 6cm junto ao teto, isto para impedir o tilintar das lâminas soltas das venezianas: é quanto basta para estabelecer corrente de ar com os vãos livremente abertos da fachada norte protegida por “quebra-sol” que, conquanto velhos de meio século, não devem ser substituídos, como se pretende, pois ainda funcionam normalmente e podem ser recuperados; apenas nos gabinetes extremos, onde a prumada dos elevadores bloqueia essa ventilação cruzada, cabe instalar – como aliás em alguns casos já ocorre – ar-condicionado.”

Entretanto, para desespero de Lucio Costa, a recomendação da abertura de fresta de 6 cm junto ao teto nunca foi experimentada – as pessoas esquecem, inclusive, que todos os painéis envidraçados da fachada sul são móveis – e só usam a parte de baixo, ou seja, quando venta, os papeis, naturalmente, voam. Seria uma homenagem a ele levar a sério, hoje, a sua proposta, e verificar, ao vivo, o resultado.


2 – O objetivo de integrar ao espaço arquitetônico obras de arte do melhor quilate, que ali, além de seu valor individual, passaram a fazer parte de um todo maior – incluídas como peças não apenas participantes, mas essenciais à própria expressão arquitetônica – compreendida como uma modalidade de “partitura musical” – da qual fazem também parte o mobiliário, as luminárias, enfim, todo o equipamento de ambientação interna: o “Ministério” é um todo.

As imagens anexas da disposição interna do grande saguão que contém o mural de Portinari falam por si: na primeira, em preto e branco, o original, e na segunda a desastrada inclusão de sancas no teto para iluminar o painel, além de um cordão de isolamento e mais o deslocamento das cadeiras – ou seja, retirando do painel a sua função de parte integrante do espaço arquitetônico, melancolicamente transfigurado em mera sala de qualquer museu.

O fundamental é que toda e qualquer intervenção física no prédio tenha como objetivo principal não comprometer sua identidade original em nome dos novos usos, quaisquer que sejam.

Maria Elisa Costa
Rio, 5 de julho de 2011"


Depois disso recebo um outro email, também de Maria Elisa, assustada com a notícia de que a licitação para as obras no edifício foi feita pelo menor preço, sem qualificação prévia. Segundo ela, o resultado foi que ganharam duas empresas de São Paulo e uma de Curitiba, inteiramente alheias ao prédio.


Repito que não sei de nada ainda, mas tenho um aperto no coração. E como ando lendo Rubem Braga, logo me pergunto: "será que só eu sou assim, ou os outros disfarçam melhor?"